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A Quinta das Carvalhas é a primeira na zona a propor um programa de observação de aves dentro de portas. As vinhas ficam em segundo plano. A atenção centra-se no que "habitualmente não se vê" - as aves, que sazonalmente ou não, habitam aquela paisagem artística.
Paulo Travassos assegura nunca ter tocado um instrumento musical. "Só campainha da porta." "E fugia logo", brinca. Acabámos de o conhecer. Pelos primeiros acordes, diríamos facilmente que este colaborador do Laboratório de Ecologia Aplicada da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (LEA-UTAD) com grande parte do trabalho dedicado ao estudo das aves teria todo um passado de formação musical... O seu ouvido só pode descrever-se com um superlativo absoluto apuradíssimo.
Se imagina uma sessão de birdwatching estando parado a ver os passarinhos passar, desengane-se. Até se pode permanecer no mesmo local durante largos minutos, mas, por norma, há todo um "percurso" a fazer antes de chegar à ave. Pelo menos, quando estamos no coração do Douro vinhateiro para observar pássaros de diversas espécies, a maior parte de pequeno porte. "Pretende-se mostrar o que já cá está, mas habitualmente não se vê", elucida Mário Santos, investigador do LEA-UTAD, logo no início da visita.
Neste jogo de descobertas, tão ou mais importante do que a vista é, precisamente, a audição. Quase sempre, será o registo sonoro a dar o alerta para a presença de uma determinada ave (superada essa fase, o desafio passa a ser localizá-la visualmente).
E se, a nós, os cantos parecem quase todos iguais, há quem consiga deslindar num coro de pássaros as "vozes" intervenientes "a tutinegra-de-barrete-preto tem um som mais flautado"; "o pisco-de-peito-ruivo é este canto mais baixo, de sonoridade vidrada "; "o estorninho-preto emite um som em tom agudo"...
Durante uma manhã, das oito em ponto até para lá do meio-dia, Paulo Travassos será o nosso David Attenborough, o nosso Félix Rodriguez de la Fuente. Mais do que os binóculos que temos ao peito é através das suas indicações que desvendamos na paisagem aves que, por vezes, nem de nome conhecíamos.
Aí começa o "documentário". Quem nos guia nunca fica pela identificação adjetivada do canto da ave. Conta uma história sobre o ser que acaba de apresentar fala da família, dos hábitos de vida, das estratégias de sobrevivência ou da função que desempenha em todo o ecossistema.
Isso mesmo se passa com a primeira vedeta da manhã. O tentilhão faz-se notar através do canto - "Parece os Abba!", exclama um colega de observação, pondo o grupo a rir.
Ao vê-lo, com a coroa-azul acinzentada e o peito rosado, Paulo não tem dúvidas: "É um macho!", alerta -"as fêmeas têm uma coloração bem mais sombria", diz abrindo logo o seu bem gasto Guia de Aves e mostrando-nos o retrato do pássaro ilustrado no papel. Alimenta-se de sementes, grãos e frutos, justificando o seu bico grosso e curto. Em zonas agrícolas, como esta, a sua função é importante: "Leva sementes de um lado para o outro expandindo as espécies vegetais e contribui para limitar as pragas de insetos. Na primavera, captura-os para alimentar os seus pintos", explica o investigador.
O 'FAVOR' DO PICA-PAU
O tentilhão é um bom mote para falar desta atividade de turismo ornitológico. Bem no coração do Douro vinhateiro, a Quinta das Carvalhas promove-a no âmbito de um projeto maior, cujo objetivo como explica Rui Soares, engenheiro agrónomo da Real Companhia Velha "é o fomento da biodiversidade nas quintas para limitação natural de pragas e doenças". Em suma, "deixando a natureza funcionar". As aves são um elemento-chave...
Os investigadores do LEA-UTAD identificaram até ao momento 60 espécies diferentes na Quinta. Mas a descoberta é permanente. Durante o passeio em que participamos, descobrem uma nova: o açor.
A ave de rapina florestal, conhecida por ser uma caçadora de emboscada, está dissimulada em cima de um ramo, sentidos alerta.
É o seu estado habitual "fica parada, em silêncio, à espera que pássaros como os pombos e as rolas passem à sua frente para um belo repasto".
Ali perto anda um andorinhão, asas desproporcionais em relação ao corpo pequeno, adaptadas ao seu voo rápido e planado. De sedentário, ao contrário do tentilhão, tem pouco: passa a vida no ar e é lá que realiza boa parte das funções vitais: "come, caça, acasala, pousando apenas para chocar os ovos num qualquer edifício ou muro em ruínas, bem alto".
Na paisagem, outros elementos despertam atenção. De repente, os olhares concentram-se no tronco de uma árvore, onde um orifício deixa adivinhar um antigo ninho de pica-pau. "Hoje poderá estar a ser utilizado por um casal de chapins ou de trepadeiras, aves insetívoras, tão pequeninas que nunca conseguiriam abrir orifícios no tronco de uma árvore, para pôr os ovos e criar os pintos a salvo de predadores", ensina Paulo.
O pequeno autocarro descapotável, que nos conduz pela imensa propriedade, para em pontos estratégicos, a partir dos quais se fazem, por vezes, pequenas caminhadas.
Sair da cama às sete da manhã pode custar, mas com o sol a vincar a sua presença, agradece-se o início da visita às oito em ponto. Sobre rodas, as conversas viram-se, com naturalidade, para a vegetação. As vinhas (há-as ali de sete e 70 anos, manuais e mecanizadas...), os olivais, as árvores de fruto, as bermas com vegetação rasteira e plantas aromáticas... Flora e fauna sempre lado a lado a influenciarem-se mutuamente e a deixarem perceber ao visitante o funcionamento da Quinta como um todo.
Em Portugal, estima Paulo, "o vale do Douro é certamente um dos sítios com maior diversidade de espécies, a par do interior das Beiras e da margem norte da bacia do Tejo interior e Alentejo". Onde estamos há a vantagem de associar aves do meio terrestre a outras de meio aquático (mais perto do rio é fácil observar o corvo-marinho, o guarda-rios, a garça real).
MEMÓRIAS...
O telescópio, que quem orienta a visita traz, é útil. Quando se usa, boa parte da dificuldade (a localização do pássaro) está cumprida. O participante apenas espreita para ver a ave. Assim observamos bem longe de nós o chapim-real, de peito amarelo onde sobressai o que parece ser uma gravata preta. Insetívoro por excelência, tem papel determinante no controle de pragas, embora não dispense pequenas sementes.
Precisaríamos de muitas páginas para falar das mais de 30 espécies que observámos.
Da fêmea de tartaranhão caçador (nidifica no solo, em zonas com tojo ou urze, e não nas árvores) que vemos passar com uma presa nas patas para levar às crias; do pombo torcaz, o maior da Europa; do gaio e do seu papel na dispersão de landes (o fruto) de carvalho; da águia d'asa redonda, essa ave de rapina compacta com uma meia-lua bem desenhada no peito; da águia calçada que, ao contrário da maior parte das rapinas, tem muitas penas nas patas; da bonita escrevedeira de garganta preta que quase se confunde com a vinha...
Pouco depois do meio-dia a visita chega ao fim. "Há mais calor e menos atividade dos passeriformes", explica Paulo. As águias que também vemos, pelo contrário, estão no seu "pico de atividade", "aproveitando as correntes de ar mais pesadas para se deslocarem".
Martina, uma turista canadiana que não revela o apelido, está sentada ao pé do rio no final da visita, lendo sobre as espécies que observou. Conhece todas bem. É birdwatcher há anos e espanta-se que em Portugal a atividade não tenha muitos praticantes: "Na América do Norte é um grande hobbie e uma importante fonte de turismo." Para ela, a importância é, antes de tudo, ambiental: "Se entendermos o ambiente, não o destruímos. Apercebemo-nos que cada parte tem a sua função."
Para qualquer sítio que se desloque, Martina é inseparável dos seus binóculos e do seu guia de aves: "Só tiro fotografias e memórias. Nunca levo nada para casa, seja uma planta, um animal, uma pena sequer..."
http://visao.sapo.pt/onde-esta-o-andorinhao=f680963
Um dia ainda hei-de fazer isto ,concerteza darei bem conta do recado ,assim o espero ,isto sim é natureza ,é paixâo ,sei lá ... ... ...

Paulo Travassos assegura nunca ter tocado um instrumento musical. "Só campainha da porta." "E fugia logo", brinca. Acabámos de o conhecer. Pelos primeiros acordes, diríamos facilmente que este colaborador do Laboratório de Ecologia Aplicada da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (LEA-UTAD) com grande parte do trabalho dedicado ao estudo das aves teria todo um passado de formação musical... O seu ouvido só pode descrever-se com um superlativo absoluto apuradíssimo.

Se imagina uma sessão de birdwatching estando parado a ver os passarinhos passar, desengane-se. Até se pode permanecer no mesmo local durante largos minutos, mas, por norma, há todo um "percurso" a fazer antes de chegar à ave. Pelo menos, quando estamos no coração do Douro vinhateiro para observar pássaros de diversas espécies, a maior parte de pequeno porte. "Pretende-se mostrar o que já cá está, mas habitualmente não se vê", elucida Mário Santos, investigador do LEA-UTAD, logo no início da visita.
Neste jogo de descobertas, tão ou mais importante do que a vista é, precisamente, a audição. Quase sempre, será o registo sonoro a dar o alerta para a presença de uma determinada ave (superada essa fase, o desafio passa a ser localizá-la visualmente).
E se, a nós, os cantos parecem quase todos iguais, há quem consiga deslindar num coro de pássaros as "vozes" intervenientes "a tutinegra-de-barrete-preto tem um som mais flautado"; "o pisco-de-peito-ruivo é este canto mais baixo, de sonoridade vidrada "; "o estorninho-preto emite um som em tom agudo"...


Durante uma manhã, das oito em ponto até para lá do meio-dia, Paulo Travassos será o nosso David Attenborough, o nosso Félix Rodriguez de la Fuente. Mais do que os binóculos que temos ao peito é através das suas indicações que desvendamos na paisagem aves que, por vezes, nem de nome conhecíamos.
Aí começa o "documentário". Quem nos guia nunca fica pela identificação adjetivada do canto da ave. Conta uma história sobre o ser que acaba de apresentar fala da família, dos hábitos de vida, das estratégias de sobrevivência ou da função que desempenha em todo o ecossistema.
Isso mesmo se passa com a primeira vedeta da manhã. O tentilhão faz-se notar através do canto - "Parece os Abba!", exclama um colega de observação, pondo o grupo a rir.
Ao vê-lo, com a coroa-azul acinzentada e o peito rosado, Paulo não tem dúvidas: "É um macho!", alerta -"as fêmeas têm uma coloração bem mais sombria", diz abrindo logo o seu bem gasto Guia de Aves e mostrando-nos o retrato do pássaro ilustrado no papel. Alimenta-se de sementes, grãos e frutos, justificando o seu bico grosso e curto. Em zonas agrícolas, como esta, a sua função é importante: "Leva sementes de um lado para o outro expandindo as espécies vegetais e contribui para limitar as pragas de insetos. Na primavera, captura-os para alimentar os seus pintos", explica o investigador.
O 'FAVOR' DO PICA-PAU
O tentilhão é um bom mote para falar desta atividade de turismo ornitológico. Bem no coração do Douro vinhateiro, a Quinta das Carvalhas promove-a no âmbito de um projeto maior, cujo objetivo como explica Rui Soares, engenheiro agrónomo da Real Companhia Velha "é o fomento da biodiversidade nas quintas para limitação natural de pragas e doenças". Em suma, "deixando a natureza funcionar". As aves são um elemento-chave...

Os investigadores do LEA-UTAD identificaram até ao momento 60 espécies diferentes na Quinta. Mas a descoberta é permanente. Durante o passeio em que participamos, descobrem uma nova: o açor.

A ave de rapina florestal, conhecida por ser uma caçadora de emboscada, está dissimulada em cima de um ramo, sentidos alerta.
É o seu estado habitual "fica parada, em silêncio, à espera que pássaros como os pombos e as rolas passem à sua frente para um belo repasto".


Ali perto anda um andorinhão, asas desproporcionais em relação ao corpo pequeno, adaptadas ao seu voo rápido e planado. De sedentário, ao contrário do tentilhão, tem pouco: passa a vida no ar e é lá que realiza boa parte das funções vitais: "come, caça, acasala, pousando apenas para chocar os ovos num qualquer edifício ou muro em ruínas, bem alto".

Na paisagem, outros elementos despertam atenção. De repente, os olhares concentram-se no tronco de uma árvore, onde um orifício deixa adivinhar um antigo ninho de pica-pau. "Hoje poderá estar a ser utilizado por um casal de chapins ou de trepadeiras, aves insetívoras, tão pequeninas que nunca conseguiriam abrir orifícios no tronco de uma árvore, para pôr os ovos e criar os pintos a salvo de predadores", ensina Paulo.


O pequeno autocarro descapotável, que nos conduz pela imensa propriedade, para em pontos estratégicos, a partir dos quais se fazem, por vezes, pequenas caminhadas.

Sair da cama às sete da manhã pode custar, mas com o sol a vincar a sua presença, agradece-se o início da visita às oito em ponto. Sobre rodas, as conversas viram-se, com naturalidade, para a vegetação. As vinhas (há-as ali de sete e 70 anos, manuais e mecanizadas...), os olivais, as árvores de fruto, as bermas com vegetação rasteira e plantas aromáticas... Flora e fauna sempre lado a lado a influenciarem-se mutuamente e a deixarem perceber ao visitante o funcionamento da Quinta como um todo.

Em Portugal, estima Paulo, "o vale do Douro é certamente um dos sítios com maior diversidade de espécies, a par do interior das Beiras e da margem norte da bacia do Tejo interior e Alentejo". Onde estamos há a vantagem de associar aves do meio terrestre a outras de meio aquático (mais perto do rio é fácil observar o corvo-marinho, o guarda-rios, a garça real).


MEMÓRIAS...
O telescópio, que quem orienta a visita traz, é útil. Quando se usa, boa parte da dificuldade (a localização do pássaro) está cumprida. O participante apenas espreita para ver a ave. Assim observamos bem longe de nós o chapim-real, de peito amarelo onde sobressai o que parece ser uma gravata preta. Insetívoro por excelência, tem papel determinante no controle de pragas, embora não dispense pequenas sementes.


Precisaríamos de muitas páginas para falar das mais de 30 espécies que observámos.
Da fêmea de tartaranhão caçador (nidifica no solo, em zonas com tojo ou urze, e não nas árvores) que vemos passar com uma presa nas patas para levar às crias; do pombo torcaz, o maior da Europa; do gaio e do seu papel na dispersão de landes (o fruto) de carvalho; da águia d'asa redonda, essa ave de rapina compacta com uma meia-lua bem desenhada no peito; da águia calçada que, ao contrário da maior parte das rapinas, tem muitas penas nas patas; da bonita escrevedeira de garganta preta que quase se confunde com a vinha...


Pouco depois do meio-dia a visita chega ao fim. "Há mais calor e menos atividade dos passeriformes", explica Paulo. As águias que também vemos, pelo contrário, estão no seu "pico de atividade", "aproveitando as correntes de ar mais pesadas para se deslocarem".

Martina, uma turista canadiana que não revela o apelido, está sentada ao pé do rio no final da visita, lendo sobre as espécies que observou. Conhece todas bem. É birdwatcher há anos e espanta-se que em Portugal a atividade não tenha muitos praticantes: "Na América do Norte é um grande hobbie e uma importante fonte de turismo." Para ela, a importância é, antes de tudo, ambiental: "Se entendermos o ambiente, não o destruímos. Apercebemo-nos que cada parte tem a sua função."
Para qualquer sítio que se desloque, Martina é inseparável dos seus binóculos e do seu guia de aves: "Só tiro fotografias e memórias. Nunca levo nada para casa, seja uma planta, um animal, uma pena sequer..."


http://visao.sapo.pt/onde-esta-o-andorinhao=f680963
Um dia ainda hei-de fazer isto ,concerteza darei bem conta do recado ,assim o espero ,isto sim é natureza ,é paixâo ,sei lá ... ... ...
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